Deixo vocês com este belo conto...
sábado, 24 de dezembro de 2011
Feliz Natal!
Deixo vocês com este belo conto...
sábado, 17 de dezembro de 2011
17 de dezembro - aniversário de Érico Veríssimo
sexta-feira, 16 de dezembro de 2011
16 de Dezembro
domingo, 20 de novembro de 2011
20 de novembro - Dia da Consciência Negra (Viver outra vez)
- A entrevista, lembra?
Olhou as roupas espalhadas, móveis empoeirados e ele desculpou-se:
- Poucos vêm aqui. Achava que minha próxima visita seria a morte.
Observou-a. Pequena, inquieta, mãozinhas curiosas nos discos e livros.
Depois, pernas cruzadas – gravador ligado – murmurou, voz rouca:
- O terreiro do bairro quer fazer um trabalho sobre memória.
Ele, aborrecido, negou depoimento. Tentava esquecer o passado - fantasma que se escondia sob a cama.
- O senhor ajudou a fundar associações, a desmascarar a ideologia da falsa democracia racial – ela insistiu.
Um dia fora professor. Mas ela não sabia que agora não era mais nada?
Que, há algum tempo, o coração vinha ameaçando parar?
- Minha filha, esqueça-se de mim.
Com o esforço de levantar-se arregalou os olhos. Ela assustou-se:
- Que foi?
- Tonturas, já passa.
Caiu, sem dizer mais nada.
Apavorada, ela procurou vizinhos. Um taxista veio. Gordo, dirigia com a barriga encostada ao volante. No pronto-socorro lotado, brigaram para serem atendidos. Um jovem médico os recebeu, perguntando:
- Seu pai? É só pressão um pouco alta. Vocês da raça negra são muito sujeitos a ter hipertensão.
Receitou maleato de enalapril e mandou-os embora.
Na volta, no táxi, ela ouviu-o, voz trêmula de velho, sussurrar
“obrigado”.
- Por fazer o senhor ficar nervoso – sorriu -, ir para o hospital?
- Por se preocupar comigo. Sabe, já estou no fim…
Ele olhou pela janela do carro. Viu crianças sem camisas jogando futebol nas ruas.
- Só não pensei – continuou – que fosse terminar viúvo, sem filhos, aqui, neste bairro, que é quase outra cidade. Quem povoou Perdizes, Bela Vista? A negrada. Minha família sempre morou lá.
- Nasci aqui – ela afirmou. – É legal. Um pouco perigoso, ultimamente. Uns amigos morrendo por causa de drogas. Dezesseis, dezessete anos. Não lhe parece que existe um plano para exterminar nosso povo?
O que o tocou, quando ela ergueu o rosto e fitou-o? Os olhos úmidos?
Quase menina, tão preocupada com sua gente. Queria dizer-lhe para não se iludir, mas a frase ficou presa dentro do peito, mesmo quando ela voltou outras vezes, depois do trabalho, para ver como estava. Um dia chegou, tirou o walk-man, passou os dedos nos móveis e exclamou:
- Tem tanto pó!
- Foi acumulando com as decepções – ele brincou.
No dia seguinte, de bermudas, coxas roliças à mostra, ela espanou, varreu. Não podia ver nada envelhecer? Pensava, com a alegria de menina, em remoçá-lo? Num domingo, chegou com discos:
- Racionais, conhece? Bom pra caramba.
Ouviu e gostou. Parecia escutar a si mesmo nos versos dos raps, rapaz crescendo revoltado nos cortiços do Bixiga. Mas o que a moça queria, enchendo o lugar com música, verificando se comia direito, arrumando as camisas no guarda-roupa?
- Vê-lo recuperar-se – ela dizia. – Já está mais moço.
Acreditava no poder de cura de mãos movidas por carinho. Deu-lhe as suas e levou-o a bares onde pagodeiros punham a alma para percutir os instrumentos. Dançou com ele, sob olhares curiosos, diferentes daqueles que os vizinhos lhes dirigiam, quando passavam nas ruas, mãos entrelaçadas.
Ouvia-os dizer: Podia ser sua filha, que sem-vergonha.
Ela nem ligava. O velho mais desiludido tornava-se o mais animado.
O homem que ajudara seu povo a se organizar despertava, às vezes, no trovão da gargalhada.
Mas, num sábado, tristezas de outrora emergiram no poço dos olhos. Ao vislumbrá-las, fez de tudo para levá-lo à praia. Pularam sete ondas, despachando as coisas ruins que pesavam nos ombros. Gotas de água em seus cabelos eram minúsculos sóis. Deitadinhos na areia, contou a ele sobre o pai, disse que jamais o conhecera. Os olhos marejaram, uma sombra passou por seu rosto. Então, mudou de assunto e puxou-o para brincar na água.
Voltaram da viagem à noite. Entraram no pequeno apartamento rindo de tudo, de nada. Dono ainda de olhos tristes, mas animado. Bateu-lhe no peito sem feri-lo. Acariciou sua carapinha. Depois, olhou-o durante um bom tempo e beijou sua boca sorridente. Idade pra ser o pai?
- Sou virgem – ela murmurou. – Não posso engravidar.
As roupas ficaram sobre o tapete, espalhadas.
De mãos dadas na padaria, no mercado, ouviam os vizinhos:
É a sobrinha?- uns perguntavam.
Amante. – outros diziam, baixinho.
Ele ia receber a aposentadoria e ficava no ponto de ônibus meia hora.
Enquanto outros reclamavam, permanecia impassível, dono de um segredo.
É a concubina. – Parecia escutar alguém sussurrando.
Sentia-se leve, até ser acometido por uma dorzinha besta no peito.
No centro da sala, o homem sentado no sofá é uma pálida lembrança daquele que, outrora, acreditara na sua gente. Que fantasmas o acompanhariam ao cemitério? Ela assustou-se, ao vê-lo com as mãos sobre o peito.
- Coração?
- Um coração enfraquecido pelas desilusões.
Por que não falava desses fantasmas?
- Não confia em mim? Quer dizer que eu não sou nada?
- O gravador – ele pediu, imediatamente após ouvi-la falar.
Esperou-a tirar o sony da bolsa e continuou:
- No início do século, previa-se o desaparecimento da nossa, não digo raça, que só existe a raça humana. E melhor etnia. As elites brasileiras queriam um país sem negros e mulatos. Quando soube dessas idéias, a luz da revolta me iluminou. Uns amigos falaram-me sobre Zumbi, sobre os quilombos, sobre união. Acreditei que a união fosse possível. Mas o sonho se desfez tão rápido! Os amigos se cansaram. O nosso povo? Desinteressado, apático. Não sei – enxugou uma lágrima – como não desapareceu.
- O que vocês fizeram foi bonito.
- São coisas que eu preciso esquecer.
- Hoje os problemas são os mesmos. Mas há pessoas jovens, querendo aprender, como eu. Quero acreditar em algo. Nosso povo sobreviveu porque acreditou na vida.
- É verdade. Parece que nós temos de adquirir uma força tão grande, parece que um amor pela vida se enraíza tão fundo dentro da gente, que nada nos abala com facilidade. E se a gente cai, é pra levantar mais forte; se apanhamos, voltamos a brigar com mais garra; se choramos, também aprendemos a extrair, lá de dentro, uma gargalhada tão gostosa, que é como se toda a alegria do mundo coubesse em nosso peito. Somos negros e temos essa força. Isso é maravilhoso.
Ela abraçou-o, beijou-o. Só então ele se deu conta de que falara com entusiasmo. Uma parte do sonho ainda vivia. Mas as dores no peito persistiram. Ela vinha mais vezes, preparava arroz integral, moderou no sal e tirou o açúcar branco.
- A pinga com carqueja eu não jogo fora – ele protestou. Era para diabetes, um amigo tinha ensinado.
Ficava irritado com os excessos de cuidados. No fundo, sentia falta quando ela não vinha. A menina de uma geração tão diferente, com quem reaprendia a viver. A moça que acreditava nas coisas em que ele acreditara.
Num domingo, sentindo o relógio no peito se acelerar, disse-lhe:
- Não vou durar muito. Só lamento não ter tido filhos.
Notou que ela ficou calada, pensativa. Escondia algo?
Veio na segunda-feira. Preocupada, tensa. Acusou-o de cerceá-la. Tensão pré-menstrual? Que havia?
- Estou grávida – disse, por fim. – Não posso. Tenho estudos.Também não quero um filho pra crescer como eu, sem pai.
Foi até a janela. Suas lágrimas rolavam como a chuva lá fora.
- Um filho? – ele perguntou, incrédulo. – A soma do meu e do teu sonho. Olhe – pegou-lhe a mão e pôs sobre seu próprio peito – parou de doer. Podemos criar esse filho, se você quiser. – Então abraçou-a e, com a voz embargada, soluçando, falou: – Te amo.
Quando eles passavam, grávidos, ouviam os vizinhos comentarem:
É o filho – uns diziam.
O neto – outros apostavam.
- É o amor nos recriando – diziam um ao outro.
Acho muito interessante a forma como os personagens vão descobrindo os sentimento e voltando mesmo a viver. A jovem que cresceu sem pai numa comunidade pobre, o idoso que viu seus sonhos de liberdade e igualdade não se concretizarem, que se sente melancólico ao ver que muitos não se importam com a questão racial e que, por isso, muitas histórias tristes continuam se repetindo. Neste conto o protagonista, através dos comentários realistas (ou pessimistas), exprime sua dor pela desigualdade:
"(...) No início do século, previa-se o desaparecimento da nossa, não digo raça, que só existe a raça humana. E melhor etnia. As elites brasileiras queriam um país sem negros e mulatos. Quando soube dessas idéias, a luz da revolta me iluminou. Uns amigos falaram-me sobre Zumbi, sobre os quilombos, sobre união. Acreditei que a união fosse possível. Mas o sonho se desfez tão rápido! Os amigos se cansaram. O nosso povo? Desinteressado, apático. Não sei – enxugou uma lágrima – como não desapareceu.(...)"
Até mesmo o espírito ardente da juventude do qual a moça é imbuída não a livra de pensamento desanimadores:
"(...)- Nasci aqui – ela afirmou. – É legal. Um pouco perigoso, ultimamente. Uns amigos morrendo por causa de drogas. Dezesseis, dezessete anos. Não lhe parece que existe um plano para exterminar nosso povo?(...)"
No dia seguinte, de bermudas, coxas roliças à mostra, ela espanou, varreu. Não podia ver nada envelhecer? Pensava, com a alegria de menina, em remoçá-lo? Num domingo, chegou com discos:
- Racionais, conhece? Bom pra caramba.
"(...)Ouviu e gostou. Parecia escutar a si mesmo nos versos dos raps, rapaz crescendo revoltado nos cortiços do Bixiga. Mas o que a moça queria, enchendo o lugar com música, verificando se comia direito, arrumando as camisas no guarda-roupa?(...)"
Com o passar do tempo, o idoso começa a demonstrar que seus sonhos podem não estar mortos:
- Hoje os problemas são os mesmos. Mas há pessoas jovens, querendo aprender, como eu. Quero acreditar em algo. Nosso povo sobreviveu porque acreditou na vida.
"(...)- É verdade. Parece que nós temos de adquirir uma força tão grande, parece que um amor pela vida se enraíza tão fundo dentro da gente, que nada nos abala com facilidade. E se a gente cai, é pra levantar mais forte; se apanhamos, voltamos a brigar com mais garra; se choramos, também aprendemos a extrair, lá de dentro, uma gargalhada tão gostosa, que é como se toda a alegria do mundo coubesse em nosso peito. Somos negros e temos essa força. Isso é maravilhoso.Ela abraçou-o, beijou-o. Só então ele se deu conta de que falara com entusiasmo. Uma parte do sonho ainda vivia.(...)"
Por fim, aparece a esperança comum a todos: uma criança a caminha, os sonhos restaurados, tudo iria se iniciar novamente, a vida começa seu ciclo. Aquele filho era fruto do amor e dos sonhos daquelas duas pessoas. Não era apenas fisicamente que o idoso voltava a viver, eram seus sonhos que renasciam depois de tanto tempo de desilusões:
"(...)- Um filho? – ele perguntou, incrédulo. – A soma do meu e do teu sonho. Olhe – pegou-lhe a mão e pôs sobre seu próprio peito – parou de doer. Podemos criar esse filho, se você quiser. – Então abraçou-a e, com a voz embargada, soluçando, falou: – Te amo.Quando eles passavam, grávidos, ouviam os vizinhos comentarem: É o filho – uns diziam.O neto – outros apostavam.- É o amor nos recriando – diziam um ao outro.(...)"
quarta-feira, 2 de novembro de 2011
Dia de Finados
Dia de Todos os Santos - Tomás Morus
domingo, 2 de outubro de 2011
Lembranças de um bruxo muito especial...
segunda-feira, 22 de agosto de 2011
Literatura em Quadrinhos
quinta-feira, 18 de agosto de 2011
Mangás
Mangás
Mangás
Mangás
quinta-feira, 4 de agosto de 2011
Mangás
quarta-feira, 6 de julho de 2011
“Auto da Índia” de Gil Vicente e “Vicente” de Miguel Torga – Comparação.
Nos dois textos temos atitudes de rebeldia. Na farsa, AMA agradece o mar por tirar-lhe o marido e permitir-lhe viver aventuras com outros homens. No conto, Vicente voa livremente sobre as águas, num desafio a Deus e à submissão.
Mas temos uma situação comum tanto a farsa de Gil Vicente quanto ao conto de Miguel Torga; o mar representa a liberdade, a aventura, o NÃO a opressão da sociedade ou de outras forças supremas.
Manuscrito encontrado numa garrafa - Edgar Allan Poe
Se “depois da tempestade sempre vem à bonança”, no enredo do conto citado acima, depois da bonança vem à tempestade. Desta forma, o mar é o próprio mistério, algo sobrenatural e superior ao homem que o submete a seus caprichos e as suas vontades.
O vento que sopra sobre ele dá-lhe um aspecto selvagem, como se fosse a própria morte que deseja tragar os “intrusos” que se aventuram pelas grandes águas marinhas.
O mar surge como um personagem, um antagonista que vai se opor ao angustiado protagonista que luta para manter-se vivo (ou já estaria morto?), e representa todo o horror na sua “Treva profunda” e seu negrume de ébano.
Se Castro Alves, poeta brasileiro romântico, no seu poema pessimista “Adeus” cita o mar como “O Jó eterno”, ou seja, o representante do sofrimento sem fim, podemos dizer que Poe, no desfecho do conto, dá esta característica ao mar, pois, o sofrimento e o mistério que envolvem o protagonista, além da sua angústia, não terminam, se tornam apenas um ciclo de luta psicológica e física.
Só então temos a explicação do título. Os famosos “manuscritos nas garrafas” que já foram mensageiros de amores proibidos e intensos, agora são descrições de tragédias marítimas de um marinheiro angustiado.
Iracema - José de Alencar
Quando Martim chega a América, encontra-se com Iracema (anagrama de América). O mar proporciona o encontro de duas culturas diferentes que logo entrariam em conflito. As águas que trazem o descobridor valente aos trópicos serve como ponte para uma nova ideia de civilização que os europeus acreditavam não ser possível existir. Quem se aventura-se neste mar poderia pagar um alto preço. Dominar o mar, segundo Fernando Pessoa, poderia custar o choro de mães, noivas abandonadas, que o tornaram salgado, tamanha a quantidade de lágrimas choradas.
Desta forma, o mar seria glória para os estrangeiros vindos do Velho Mundo, mas seria a perdição para os nativos do Novo Mundo, pois teriam suas terras invadidas e seus povos dizimados por conquistadores que não admitiam outras culturas.
Quando Martim vai embora de volta para a Europa, levando Moacir, fruto de seu amor com a índia Iracema, temos um retrato da “sina” dos nordestinos, obrigados a sair da sua terra em busca de novas coisas, novas oportunidades.
Era a formação de uma nova raça (ou etnia), a dos brasileiros, povo mestiço, consequência do sucesso ou fracasso das grandes navegações do século XVI.
O mar é, então, a fuga de volta para a casa, na qual Martim leva algo da América para si.
O velho e o Mar - ( Ernest Hemingway ) - Enquanto houver sonho, haverá luta
Quando as páginas de “O velho e o mar” de Ernest Hemingway chegam ao fim, temos a sensação se missão cumprida do velho Santiago exposta aos demais pescadores da enseada e a todos os leitores. Sentimo-nos exaustos depois de tamanha luta, que não se resume apenas a conservação da integridade física, mas também a conservação da integridade moral.
O velho Santiago parece frágil fisicamente no romance, diferente do senhor gordinho que o interpreta no filme. Mas a diferença física não dificulta a interpretação do protagonista Spencer Tracy, grande representante dos tempos áureos de Hollywood.
A pele queimada de Santiago destaca-se no filme ainda mais que no romance, retificando a sua imagem de homem do mar, que tem as águas como própria casa. Sendo o velho e o mar um romance “de um homem só”, que tem sua narrativa centrada num único personagem humano que tem como oponentes um peixe e o próprio mar, que serve de alento, mas também de perigo, o filme pode se tornar enfadonho para aqueles que não sabem apreciar uma obra reflexiva, que não é centrada apenas em intrigas tipicamente sentimentalóides do ser humano.
Mas qualquer obra da sétima arte, mesmo aquelas produzidas numa época mágica como a década de cinquenta, não consegue passar na sua narrativa, a intensidade cognitiva que o romance escrito passa. Os sonhos de Santiago, seus desejos de sobrevivência, a consciência de que o mais forte sobrevive na lei da selva, ou lei do mar, não são transmitidas plenamente no filme, pois para que esta emoção seja transmitida, precisa haver interação imaginativa entre o leitor e a obra, e esta interação é mais forte e completa quando podemos saborear as frases e cada momento de luta sozinhos com a nossa mente, assim como o velho Santiago está sozinho na sua luta no mar.
O velho e o Mar (Ernest Hemingway) - Estória para pescadores e para sonhadores
Por que Santiago teria que se auto-afirmar provando que ainda era capaz de ser um bom pescador? Talvez porque os homens necessitam disso, é a lei da “Selva”, na qual o mais forte sobrevive, por isso é necessário ser sempre o melhor e mostrar que é o melhor.
“O Velho e o Mar” não é apenas uma estória de pescador, não contêm o exagero por si só, sem alguma expectativa. Para o velho Santiago, o peixe pelo qual ele quase dá a vida, é uma prova de que ele ainda pode se sentir vivo, a confirmação de que ele existe e é bom naquilo que gosta de fazer: pescar. Nada melhor para um homem solitário do que isolar-se na imensidão das águas, nas quais ele pode enxergar-se e sentir-se parte daquela imensidão.
A tradição popular trata com humor os “causos” contados por pescadores, que garantem ter pescado peixes tão grandes que eles nem conseguiram guardar como prova, basta fiar-se na palavra. Santiago precisava de mais do que uma prova física de que foi capaz de pescar um grande peixe. Ele precisava provar a si mesmo que o mar não era páreo para ele, que ele ainda dominava a natureza quando tirava dela o fruto marinho. Era o sonho que ainda vivia, e, enquanto houver sonho, vai haver vida.
terça-feira, 14 de junho de 2011
Os casamentos mais marcantes
sexta-feira, 6 de maio de 2011
Duas mães muitos sofredoras
domingo, 24 de abril de 2011
Ressurreição na Literatura
segunda-feira, 4 de abril de 2011
Dia 02 de abril - Dia mundial da Literatura Infantil
terça-feira, 22 de março de 2011
Mocidade e Morte - Castro Alves
Mocidade e morte
Oh! eu quero viver, beber perfumes
Na flor silvestre, que embalsama os ares;
Ver minh'alma adejar pelo infinito,
Qual branca vela n'amplidão dos mares.
No seio da mulher há tanto aroma...
Nos seus beijos de fogo há tanta vida...
— Árabe errante, vou dormir à tarde
A sombra fresca da palmeira erguida.
Na primeira estrofe temos o boêmio deslumbrado, que sente perder as delícias da paixão ao lado da mulher amada. mas há um estribilho:
Mas uma voz responde-me sombria:
Terás o sono sob a lájea fria.
Ele iria, então, trocar o leito de amor pela lájea fria de um sepulcro.
Há sempre a oposição: A vida que é prazerosa e a Morte que, para Castro Alves, não é bem vinda.
Morrer... quando este mundo é um paraíso,
E a alma um cisne de douradas plumas:
Não! o seio da amante é um lago virgem...
Quero boiar à tona das espumas.
Vem! formosa mulher — camélia pálida,
Que banharam de pranto as alvoradas,
Minh'alma é a borboleta, que espaneja
O pó das asas lúcidas, douradas ...
Mais uma vez temos o apego do poeta à vida e aos prazeres que ainda estão por vir nos braços da amada.
Mas, novamente, ele constata:
E a mesma voz repete-me terrível,
Com gargalhar sarcástico: — impossível!
Era a morte que ria dos seus sonhos de vida.
Eu sinto em mim o borbulhar do gênio,
Vejo além um futuro radiante:
Avante! — brada-me o talento n'alma
E o eco ao longe me repete — avante! —
O futuro... o futuro... no seu seio...
Entre louros e bênçãos dorme a glória!
Após — um nome do universo n’alma,
Um nome escrito no Panteon da história.
Na terceira estrofe temos o apego do poeta à glória futura, furto de seu talento e de seu ardor como literato. É mesmo triste pensar quantas obras poderiam ter sido escritas por Castro Alves se ele tivesse uma chance de prolongar seu tempo na Terra.
Mas a morte novamente lhe responde:
E a mesma voz repete funerária:
Teu Panteon — a pedra mortuária!
Morrer — é ver extinto dentre as névoas
O fanal, que nos guia na tormenta:
Condenado — escutar dobres de sino,
— Voz da morte, que a morte lhe lamenta —
Ai! morrer — é trocar astros por círios,
Leito macio por esquife imundo,
Trocar os beijos da mulher — no visco
Da larva errante no sepulcro fundo,
Na quarta estrofe, o poeta mostra mais uma vez a oposição entre as belezas da vida e a trieteza da morte, vista como o fim de tudo.
Só lhe sobraria então:
Ver tudo findo... só na lousa um nome,
Que o viandante a perpassar consome.
E eu sei que vou morrer... dentro em meu peito
Um mal terrível me devora a vida:
Triste Ahasverus, que no fim da estrada,
Só tem Por braços uma cruz erguida.
Sou o cipreste, qu'inda mesmo florido,
Sombra de morte no ramal encerra!
Vivo — que vaga sobre o chão da morte,
Morto — entre os vivos a vagar na terra.
Na quinta estrofe temos a certeza do poeta de que vai morrer, ele é o cipreste que, mesmo florido, carrega a sombra da morte.
E novamente ele escuta:
Do sepulcro escutando triste grito
Sempre, sempre bradando-me: maldito!
E eu morro, ó Deus! na aurora da existência,
Quando a sede e o desejo em nós palpita..
Levei aos lábios o dourado pomo,
Mordi no fruto podre do Asfaltita.
No triclínio da vida — novo Tântalo
O vinho do viver ante mim passa...
Sou dos convivas da legenda Hebraica,
O estilete de Deus quebra-me a taça.
Na sexta estrofe temos, novamente, a dor do poeta e a constatação de que a partida será muito cedo, antes do que deveria ser.
A agonia extrema é expressa em:
É que até minha sombra é inexorável,
Morrer! morrer! soluça-me implacável.
Adeus, pálida amante dos meus sonhos!
Adeus, vida! Adeus, glória! amor! anelos!
Escuta, minha irmã, cuidosa enxuga
Os prantos de meu pai nos teus cabelos.
Fora louco esperar! fria rajada
Sinto que do viver me extingue a lampa...
Resta-me agora por futuro — a terra,
Por glória - nada, por amor — a campa.
A última estrofe é mesmo o fim, a despedida, as recomendações para os que ficam.
O poema tem um desfecho dramático:
Adeus... arrasta-me uma voz sombria,
Já me foge a razão na noite fria! ...
Agora, me respondam, Lord Byron ficaria ou não orgulhoso?
domingo, 6 de março de 2011
Minha Prima Raquel - Daphne Du Maurier
domingo, 27 de fevereiro de 2011
Moacyr Scliar - O adeus ao escritor gaúcho
A Literatura está de luto neste dia 27 de fevereiro de 2011.Morreu na cidade de Porto Alegre, Moacyr Jaime Scliar, ou apenas Moacyr Scliar, como é conhecido pelo grande público. Foi Também na capital gaúcha que o escritor nasceu, no dia 23 de março de 1937. Moacyr Scliar tinha 73 anos e seu nome ficará marcado eternamente na Literatura de Língua Portuguesa. O blog "Devaneios Literários" sente muito a perda deste grande escritor.
Bibliografia:
Conto
O carnaval dos animais. Porto Alegre, Movimento, 1968.
A balada do falso Messias. São Paulo, Ática, 1976.
Histórias da terra trêmula. São Paulo, Escrita, 1976.
O anão no televisor. Porto Alegre, Globo, 1979.
Os melhores contos de Moacyr Scliar. São Paulo, Global, 1984.
Dez contos escolhidos. Brasília, Horizonte, 1984.
O olho enigmático. Rio, Guanabara, 1986.
Contos reunidos. São Paulo, Companhia das Letras, 1995.
O amante da Madonna. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1997.
Os contistas. Rio, Ediouro, 1997.
Histórias para (quase) todos os gostos. Porto Alegre, L&PM, 1998.
Pai e filho, filho e pai. Porto Alegre, L&PM, 2002.
Romance
A guerra no Bom Fim. Rio, Expressão e Cultura, 1972. Porto Alegre, L&PM.
O exército de um homem só. Rio, Expressão e Cultura, 1973. Porto Alegre, L&PM.
Os deuses de Raquel. Rio, Expressão e Cultura, 1975. Porto Alegre, L&PM.
O ciclo das águas. Porto Alegre, Globo, 1975; Porto Alegre, L&PM, 1996.
Mês de cães danados. Porto Alegre, L&PM, 1977.
Doutor Miragem. Porto Alegre, L&PM, 1979.
Os voluntários. Porto Alegre, L&PM, 1979.
O centauro no jardim. Rio, Nova Fronteira, 1980. Porto Alegre, L&PM.
Max e os felinos. Porto Alegre, L&PM, 1981.
A estranha nação de Rafael Mendes. Porto Alegre, L&PM, 1983.
Cenas da vida minúscula. Porto Alegre, L&PM, 1991.
Sonhos tropicais. São Paulo, Companhia das Letras, 1992.
A majestade do Xingu. São Paulo, Companhia das Letras, 1997.
A mulher que escreveu a Bíblia. São Paulo, Companhia das Letras, 1999.
Os leopardos de Kafka. São Paulo, Companhia das Letras, 2000.
Na Noite do Ventre, o Diamante. Rio de Janeiro: Ed. Objetiva, 2005.
Ficção infanto-juvenil
Cavalos e obeliscos. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1981; São Paulo, Ática, 2001.
A festa no castelo. Porto Alegre, L&PM, 1982.
Memórias de um aprendiz de escritor. São Paulo, Cia. Editora Nacional, 1984.*
No caminho dos sonhos. São Paulo, FTD, 1988.
O tio que flutuava. São Paulo, Ática, 1988.
Os cavalos da República. São Paulo, FTD, 1989.
Pra você eu conto. São Paulo, Atual, 1991.
Uma história só pra mim. São Paulo, Atual, 1994.
Um sonho no caroço do abacate. São Paulo, Global, 1995.
O Rio Grande farroupilha. São Paulo, Ática, 1995.
Câmera na mão, o Guarani no coração. São Paulo, Ática, 1998.
A colina dos suspiros. São Paulo, Moderna, 1999.
Livro da medicina. São Paulo, Companhia das Letrinhas, 2000.
O mistério da Casa Verde. São Paulo, Ática, 2000.
O ataque do comando P.Q. São Paulo, Ática, 2001.
O sertão vai virar mar, São Paulo, Ática, 2002.
Aquele estranho colega, o meu pai. São Paulo, Atual, 2002.
Éden-Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 2002.
O irmão que veio de longe. Idem, idem.
Nem uma coisa, nem outra. Rio, Rocco, 2003.
Navio das cores. São Paulo, Berlendis & Vertecchia, 2003.
Crônica
A massagista japonesa. Porto Alegre, L&PM, 1984.
Um país chamado infância. Porto Alegre, Sulina, 1989.
Dicionário do viajante insólito. Porto Alegre, L&PM, 1995.
Minha mãe não dorme enquanto eu não chegar. Porto Alegre, L&PM, 1996. Artes e Ofícios, 2001.
O imaginário cotidiano. São Paulo, Global, 2001.
A língua de três pontas: crônicas e citações sobre a arte de falar mal. Porto Alegre.
Ensaio
A condição judaica. Porto Alegre, L&PM, 1987.
Do mágico ao social: a trajetória da saúde pública. Porto Alegre, L&PM, 1987; SP, Senac, 2002.
Cenas médicas. Porto Alegre, Editora da Ufrgs, 1988. Artes&Ofícios, 2002.
Se eu fosse Rotschild. Porto Alegre, L&PM, 1993.
Judaísmo: dispersão e unidade. São Paulo, Ática, 1994.
Oswaldo Cruz. Rio, Relume-Dumará, 1996.
A paixão transformada: história da medicina na literatura. São Paulo, Companhia das Letras, 1996.
Meu filho, o doutor: medicina e judaísmo na história, na literatura e no humor. Porto Alegre, Artes Médicas, 2000.
Porto de histórias: mistérios e crepúsculos de Porto Alegre. Rio de Janeiro, Record, 2000.
A face oculta: inusitadas e reveladoras histórias da medicina. Porto Alegre, Artes e Ofícios, 2000.
A linguagem médica. São Paulo, Publifolha, 2002.
Oswaldo Cruz & Carlos Chagas: o nascimento da ciência no Brasil. São Paulo, Odysseus, 2002.
Saturno nos trópicos: a melancolia européia chega ao Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 2003.
Judaísmo. São Paulo, Abril, 2003.
Um olhar sobre a saúde pública. São Paulo, Scipione, 2003.
O escritor gaúcho teve sua obra traduzida para diversos idiomas, entre eles inglês, alemão, francês, italiano, espanhol, russo e hebraico.
A noite em que os hotéis estavam cheios
Moacyr Scliar
O casal chegou à cidade tarde da noite. Estavam cansados da viagem; ela, grávida, não se sentia bem. Foram procurar um lugar onde passar a noite. Hotel, hospedaria, qualquer coisa serviria, desde que não fosse muito caro.
Não seria fácil, como eles logo descobriram. No primeiro hotel o gerente, homem de maus modos, foi logo dizendo que não havia lugar. No segundo, o encarregado da portaria olhou com desconfiança o casal e resolveu pedir documentos. O homem disse que não tinha, na pressa da viagem esquecera os documentos.
— E como pretende o senhor conseguir um lugar num hotel, se não tem documentos? — disse o encarregado. — Eu nem sei se o senhor vai pagar a conta ou não!
O viajante não disse nada. Tomou a esposa pelo braço e seguiu adiante. No terceiro hotel também não havia vaga. No quarto — que era mais uma modesta hospedaria — havia, mas o dono desconfiou do casal e resolveu dizer que o estabelecimento estava lotado. Contudo, para não ficar mal, resolveu dar uma desculpa:
— O senhor vê, se o governo nos desse incentivos, como dão para os grandes hotéis, eu já teria feito uma reforma aqui. Poderia até receber delegações estrangeiras. Mas até hoje não consegui nada. Se eu conhecesse alguém influente... O senhor não conhece ninguém nas altas esferas?
O viajante hesitou, depois disse que sim, que talvez conhecesse alguém nas altas esferas.
— Pois então — disse o dono da hospedaria — fale para esse seu conhecido da minha hospedaria. Assim, da próxima vez que o senhor vier, talvez já possa lhe dar um quarto de primeira classe, com banho e tudo.
O viajante agradeceu, lamentando apenas que seu problema fosse mais urgente: precisava de um quarto para aquela noite. Foi adiante.
No hotel seguinte, quase tiveram êxito. O gerente estava esperando um casal de conhecidos artistas, que viajavam incógnitos. Quando os viajantes apareceram, pensou que fossem os hóspedes que aguardava e disse que sim, que o quarto já estava pronto. Ainda fez um elogio.
— O disfarce está muito bom. Que disfarce? Perguntou o viajante. Essas roupas velhas que vocês estão usando, disse o gerente. Isso não é disfarce, disse o homem, são as roupas que nós temos. O gerente aí percebeu o engano:
— Sinto muito — desculpou-se. — Eu pensei que tinha um quarto vago, mas parece que já foi ocupado.
O casal foi adiante. No hotel seguinte, também não havia vaga, e o gerente era metido a engraçado. Ali perto havia uma manjedoura, disse, por que não se hospedavam lá? Não seria muito confortável, mas em compensação não pagariam diária. Para surpresa dele, o viajante achou a idéia boa, e até agradeceu. Saíram.
Não demorou muito, apareceram os três Reis Magos, perguntando por um casal de forasteiros. E foi aí que o gerente começou a achar que talvez tivesse perdido os hóspedes mais importantes já chegados a Belém de Nazaré.
Fonte: www.releituras.com/mscliar