quinta-feira, 30 de setembro de 2010

29 de setembro de 2010 - 102 anos sem Machado de Assis


Há 102 anos morria o escritor brasileiro Joaquim Maria Machado de Assis. Debilitado, recluso (sobretudo depois da morte da esposa), o "Bruxo do Cosme Velho" veio a falecer na casa em que viveu tantos anos ao lado da amada Carolina.
102 anos se passaram, mas a sua obra o tornou imortal. Seus persongens estão entre os mais celébres da Literatura brasileira e mundial. O leitor, em nossos dias, ainda sente-se seduzido por Capitu, sente-se viajando no delírio de Brás Cubas, tenta entender a filosofia louca de Quincas Borba e a psicologia do médico alienista Simão Bacamarte. E tantos foram os personagens, tantas as críticas, tantas histórias...que fizeram de Machado de Assis um escritor praticamente unânime entre os amantes da Literatura de qualidade.
E o seu nome nunca será apagado, está gravado para sempre entre os maiores da Literatura mundial.





"Eu não sou homem que recuse elogios. Amo-os; eles fazem bem à alma e até ao corpo. As melhores digestões da minha vida são as dos jantares em que sou brindado."


Machado de Assis.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Nada de novo no front - Erich Maria Remarque


"Nada de novo no front". Esta sentença põe fim a uma guerra, a Primeira Grande Guerra, que anunciava os contornos desatrosos que os conflitos mundiais trariam para a humanidade.
Para Erich Maria Remarque, homem que esteve na guerra ainda jovem e viu suas idealizações bélicas tornarem-se pó em meio ao caos sangrento, esta sentença é a sentença de um novo rumo na vida, vida esta que começava em meio a morte. Paul, protagonista do romance, chega mesmo a dizer que outros haviam partido para as trincheiras deixando para trás um passado, seria então, mais fácil voltar, mas, ele e seus amigos que acabavam de sair da adolescência, não tinham nada no passado, começariam suas vidas naquela guerra, em meio a destruição física e moral de muitos homens.
Muitos críticos tratam "Nada de novo no front", publicado em formato de livro no ano de 1929, como o maior romance pacifista do século XX. As colocações que o jovem desiludido Paul faz sobre a vida no front de batalhas, leva mesmo a esta conclusão. Cada sofrimento, cada agonia, cada ameaça de morte a ele ou a um dos companheiros, faz com que o leitor considere a guerra uma grande ferida inútil na História da humanidade.
No front de batalhas Paul reflete sobre a efemeridade da vida naquelas condições:
Nossos pensamentos são como o barro,modelados pela mudança dos dias:
são bons, quando temos dencanso, e fúnebres, quando estamos sob o fogo.
Fora e dentro de nós, há campos cheios de crateras.
(p.206)

A vida sob o fogo cruzado não permite o nascimento de planos futuros, tudo caminha de acordo com o êxito da batalha. As crateras não se formam apenas nos campos nos quais as granadas são lançadas ou no peito do soldado morto; elas se formam na consciência do soldado que sobrevive fisicamente, mas sente-se morrer ao perceberem que lutam por uma causa que não é sua, que nem ao menos conhecem direito. Os mesmo princípios que os levam a matar estão presentes na cabeça do inimigo, então, quem estaria com a razão? Alemãos, franceses, ingleses, russos...todos foram convencidos a aceitar a guerra como verdade absoluta.
As situações extremas levam os soldados a tomarem atitudes incompreensíveis para homens que deveriam estar longe da sensibilidade com a dor alheia. Os "relâmpagos" da sanidade tornam os soldados frágeis. Um exemplo disso é o o personagem Berger que, para salvar um cão, ou pelo menos dar-lhe o tiro de redenção, arrisca e perde sua vida.

Na verdade, deve ter ficado completamente louco, pois terá de atravessar uma barreira de fogo; mas é o relâmpago, sempre à espreita do nosso íntimo,que o atingiu e o transformou num possesso. Alguns deliram,outros fogem...e houve quem tentava sem parar enterrar-se, com as mãos, os pés e a boca.
(p.211)
A morte é uma constante. Torna-se parte do dia-a-dia e, mais do que nunca, a máxima de que ela é a única certeza que o homem tem torna-se presente.

Muller está morto. à queima-roupa, deram-lhe um tiro no estômago, com very Light. Ainda viveu meia hora, perfeitamente lúcido, sofrendo dores atrozes. Antes de morrer, entregou-me sua carteria e me deixou suas botas...as mesmas que herdara de Kemmerich.
(p.211).

E logo outros partiriam, já haviam partido. Deixariam suas botas de herança para os companheiros que, na distância de casa, tornavam-se a família construída no lar de destruição e desespero. Qual será o desepero de um homem em frente a morte ou sob ameaça constante? É a questão que o leitor reflete ao solidarizar-se com o alemão Paul. O tempo passa, vidas se vão, a morte fica.

Passam-se os meses. este verão de 1918 é o mais sangrento e o mais terrível de todos. Os dias são como anjos vestidos de dourado e azul, impassíveis sobre o campo da morte. Aqui, todos sabem que estamos perdendo a guerra. Não se fala muito nisto: recuamos, não vamos mais poder atacar depois desta grande ofensiva, não temos mais homens, nem munição.
Entretanto, a luta continua...a morte continua...
(p.215)

As razões que levaram os livros de Erich Maria Remarque a serem queimados durante a Segunda Guerra Mundial são muito claras no romance. Num período de ostensivo nacionalismo e dominação psicológica, não era muito comôdo ao regime nazista que o povo conhecesse a fundo a inferioridade do exército alemão no fim do primeiro conflito mundial.

Nossa artilharia está no fim...tem pouca minição...e os canos estão tão gastos que os tiros não são certeiros e atingem nossos próprios soldados. Temos poucos cavalos, nossas tropas compõe-se de rapazes anêmicos, que precisam de cuidados, que não conseguem nem carregar mochilas, mas que sabem simplesmente morrer aos milhares. Nada conhecem de guerra, apenas avançam e deixam-se derrubar . Um único aviador divertiu-se exterminando duas companhias de recrutas como estes, quando acabavam de sair do trem, antes mesmo de terem ouvido falar em abrigo!
- A Alemanha deve ficar vazia em breve - diz Kat.
(p.212).

Depois de tudo que passou, chega a conclusão de quem não tem mais nada onde se firmar, pois não teve tempo de construir uma história antes da guerra, agora só restava tentar se reconstruir, assim como o mundo teria de fazer.

E as pessoas não nos compreenderão, pois, antes da nossa, cresceu uma geração que, sem dúvida, passou esses anos junto a nós, mas que já tinha um lar e uma profissão, e que agora voltará para suas antigas colocações e esquecerá a guerra...e, depois de nós, crescerá uma geração, semelhante à que fomos em outros tempos, que nos será estranha e nos deixará de lado. Seremos inúteis até para nós mesmos. Envelheceremos, alguns se adaptarão, outros simplesmente resignar-se-ão e, por fim, pereceremos todos.
(p.222)

É, os homens nunca compreenderão. Quando Erich Maria Remarque e tantos outros largaram a escola e, a conselho dos pais, professores, eles foram lutar por uma guerra que descobriram não ser deles. Seus nomes não estarão estampados individualmente me livros de História, serão parte de um sistema bélico pronto para destrui-lhes os sonhos, as ilusões da juventude. Coube ao protagonista Paul, que dá vida as emoções de Remarque, expressar a sua perplexidade numa narrativa destituída de patriotismo, crua e realista.
"Nada de novo no front" firmou uma posição radicalmente pacifista em um mundo que ainda via a guerra como uma alternativa política e determinou o perfil antibelicista que habita a literatura ocidental até hoje.






quarta-feira, 15 de setembro de 2010

A obra de Henry James - esboço

O escritor começou a sua carreira literária em 1865 escrevendo artigos para jornais. Nunca mais abandonou a Literatura e se consagrou como um grande escritor da Literatura Norte-Americana e Inglesa em geral.
Explorou com profundidade a psicologia dos personagens e introduziu a técnica da narrativa indireta, apresentando os mesmos acontecimentos relatando ponto de vista de cada participante, recorrendo ao flashback. Sua obra compreende contos, peças, ensaios, autobiografia e vinte romances.
Podemos dividir a obra em três etapas:
- Da década de 1870 destacam-se romances como “Os Americanos”em 1877 e “Daisy Miller”em 1879. Sua produção desta época culmina com “O Retrato de Uma Senhora” de 1881, cujo tema é o confronto entre o novo mundo e os valores do velho continente. É do mesmo ano um romance muito importante “A Herdeira”, no qual James apresenta uma personagem que se opõe ao perfil feminino da época.
- Na segunda fase, Henry James experimentou vários temas e formas. Entre os anos de 1885 e 1900 três novelas conteúdo social e político foram publicadas: “Os Bostonianos” de 1886, deste ano também é “Princess Camassina”e de 1889 “The Tragic Muse”. São histórias de revolucionários e trazem uma forte influência da corrente naturalista.
Os anos de 1890 até 1895 ficaram conhecidos como “os anos dramáticos” e Henry James escreveu sete peças de teatro sendo que duas foram encenadas sem êxito. Ele voltou a narrativa e merecem destaque “The Next Time”de 1895 e um dos seus melhores romances no ano de 1898 “A Volta do parafuso”.
- A última fase da obra de Henry James é considerada por muitos críticos como a mais importante, na qual o autor explora a consciência humana e sua prosa torna-se mais densa e complexa. São deste período as obras-primas “As Asas da Pomba”de 1902, “Os Embaixadores” do ano de 1903 e “A Taça de Ouro” publicado em 1904.
Estes são apenas alguns dos muitos romances escritos por este brilhante escritor.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Não as matem - Lima Barreto

Não as matem

Esse rapaz que, em Deodoro, quis matar a ex-noiva e suicidou-se em seguida, é um sintoma da revivescência de um sentimento que parecia ter morrido no coração dos homens: o domínio, quand même, sobre a mulher.O caso não é único. Não há muito tempo, em dias de carnaval, um rapaz atirou sobre a ex-noiva, lá pelas bandas do Estácio, matando-se em seguida. A moça com a bala na espinha veio a morrer, dias após, entre sofrimentos atrozes.Um outro, também, pelo carnaval, ali pelas bandas do ex-futuro Hotel Monumental, que substituiu com montões de pedras o vetusto Convento da Ajuda, alvejou a sua ex-noiva e matou-a.Todos esses senhores parece que não sabem o que é a vontade dos outros.Eles se julgam com o direito de impor o seu amor ou o seu desejo a quem não os quer Não sei se se julgam muito diferentes dos ladrões à mão armada; mas o certo é que estes não nos arrebatam senão o dinheiro, enquanto esses tais noivos assassinos querem tudo que é de mais sagrado em outro ente, de pistola na mão. O ladrão ainda nos deixa com vida, se lhe passamos o dinheiro; os tais passionais, porém, nem estabelecem a alternativa: a bolsa ou a vida. Eles, não; matam logo.Nós já tínhamos os maridos que matavam as esposas adúlteras; agora temos os noivos que matam as ex-noivas. De resto, semelhantes cidadãos são idiotas. É de supor que, quem quer casar, deseje que a sua futura mulher venha para o tálamo conjugal com a máxima liberdade, com a melhor boa vontade, sem coação de espécie alguma, com ardor até, com ânsia e grandes desejos; como e então que se castigam as moças que confessam não sentir mais pelos namorados amor ou coisa equivalente?Todas as considerações que se possam fazer, tendentes a convencer os homens de que eles não têm sobre as mulheres domínio outro que não aquele que venha da afeição, não devem ser desprezadas.Esse obsoleto domínio à valentona, do homem sobre a mulher, é coisa tão horrorosa, que enche de indignação. O esquecimento de que elas são, como todos nós, sujeitas, a influências várias que fazem flutuar as suas inclinações, as suas amizades, os seus gostos, os seus amores, é coisa tão estúpida, que, só entre selvagens deve ter existido Todos os experimentadores e observadores dos fatos morais têm mostrado a inanidade de generalizar a eternidade do amor Pode existir, existe, mas, excepcionalmente; e exigi-la nas leis ou a cano de revólver, é um absurdo tão grande como querer impedir que o sol varie a hora do seu nascimento.Deixem as mulheres amar à vontade.Não as matem, pelo amor de Deus!

27/01/1915


O que define um homem a frente do seu tempo? Para mim, podemos definir Lima Barreto como um homem a frente do seu tempo, não apenas pela estética literária que procurava aproximar a Literatura da linguagem popular; mas por ele ter escrito uma crônica na qual defende o direito de escolha da mulher...ele, sendo homem e filho de uma época de desigualdades de todo tipo, pedia para que as mulheres não fossem mortas por suas escolhas.
Podemos considerar este texto, escrito no ano de 1915, atual? Claro que sim! Vivemos num mundo que, de justo, só tem algumas saias. A nossa sociedade acredita que homens podem julgar mulheres e condená-las à morte porque elas transgridem as leis impostas pela maioria masculina. As regras que eles podem e devem transgridir, devem ser respeitadas por todas as mulheres, e elas só mercem respeito se forem mães, esposas e namoradas dedicadas. É a nossa forma de "apedrejamento" que nós tanto criticamos do Antigo Testamento.
Somos iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros. E, dessa forma, a sociedade continua governada pelo pensamento masculino que, muitas vezes, é cultivado até mesmo pelas mulheres. Quando nós mulheres criticamos "A outra" e apoiamos nossos maridos com a justificativa de que eles têm que seguir seus instintos, estamos servindo como mais uma peça na engrenagem da alienação.
Os homens são sempre os juízes, estão acima de tudo. Eles podem decidir se somos "para casar" ou não, se merecemos a vida ou a morte. Eles podem usar qualquer justificativa ligada aos seus instintos, pois, eles são animais incontroláveis...isso separa a criação entre homens irracionais e mulheres racionais?
Aos homens tudo se perdoa, mas, e a mulher? Assim como nos grandes romances do século XIX, a mulheres deste século tão "evoluído" não têm o direito ao perdão da sociedade quando transgridem suas leis e, desta forma, nós somos Madame Bovary e Ana Karênina deste tempo, e homens como o goleiro Bruno são nossos juízes e usam isso nos tribunais para defender-se. Até que ponto nossa soceidade pode ser considerada racional por agira desta forma? Temos que aprender muito com os animais irracionais então.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Homenagem feita por Pablo Neruda ao poeta brasileiro Castro Alves

Castro Alves do Brasil


Castro Alves do Brasil, para quem cantaste?
Para a flor cantaste? Para a água
cuja formosura diz palavras às pedras?
Cantaste para os olhos para o perfil recortado
da que então amaste? Para a primavera?

Sim, mas aquelas pétalas não tinham orvalho,
aquelas águas negras não tinham palavras,
aqueles olhos eram os que viram a morte,
ardiam ainda os martírios por detrás do amor,
a primavera estava salpicada de sangue.

- Cantei para os escravos, eles sobre os navios
como um cacho escuro da árvore da ira,
viajaram, e no porto se dessangrou o navio
deixando-nos o peso de um sangue roubado.

- Cantei naqueles dias contra o inferno,
contra as afiadas línguas da cobiça,
contra o ouro empapado do tormento,
contra a mão que empunhava o chicote,
contra os dirigentes de trevas.

- Cada rosa tinha um morto nas raízes.
A luz, a noite, o céu cobriam-se de pranto,
os olhos apartavam-se das mãos feridas
e era a minha voz a única que enchia o silêncio.

- Eu quis que do homem nos salvássemos,
eu cria que a rota passasse pelo homem,
e que daí tinha de sair o destino.
Cantei para aqueles que não tinham voz.
Minha voz bateu em portas até então fechadas
para que, combatendo, a liberdade entrasse.

Castro Alves do Brasil, hoje que o teu livro puro
torna a nascer para a terra livre,
deixam-me a mim, poeta da nossa América,
coroar a tua cabeça com os louros do povo.
Tua voz uniu-se à eterna e alta voz dos homens.
Cantaste bem. Cantaste como se deve cantar.

Pablo Neruda