sexta-feira, 29 de maio de 2009

Madame Bovary - Gustave Flaubert


“Madame Bovary sou eu”. Esta frase antológica de Gustave Flaubert é uma resposta durante seu julgamento por imoralidade, quando perguntado: “Quem é madame Bovary?” É claro que a resposta enigmática não tem o significado denotativo. Isto não seria possível, já que a famosa personagem possuía características bem femininas. Ela simboliza a temática do livro, já que “Madame Bovary” é toda uma sociedade que se distanciava cada vez mais dos princípios de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” propostos durante a Revolução Francesa. Emma é uma jovem criada pelo pai viúvo e educada num convento, lá, ela lê romances românticos que tinham como público leitor mulheres como ela, que idealizavam a vida e os amores presentes naquela literatura.

Emma lera Paulo e Virgínia, sonhara com a cabana de bambus, com o preto Domingos, com o cão fiel e, principalmente, com a doce amizade de algum irmãozinho, que lhe colhesse frutos maduros em árvores mais altas que campanários ou que corresse descalço pela areia, para lhe trazer um ninho. (MADAME BOVARY p.29).
Depois de algum tempo casada com Charles Bovary, um médico viúvo, Emma percebe que ele não é nenhum herói das suas leituras, começa então a esperar alguma ação do marido que conseguisse despertar nela o amor tão sonhado e esperado. Nem mesmo o nascimento da filha Berta faz com que Emma anime-se a sentir amor pela família que constituiu. Ela só se torna amável quando encontra o primeiro amante Rodolfo Boulanger. Emma faz planos de fugir com o amante, não esperava, porém, que as intenções do conquistador não eram tão românticas quanto às dela. Ao ser abandonada, Emma mergulha-se numa profunda apatia da vida e muitos acreditam que ela não irá resistir. A doença de Emma faz Charles contrair dívidas, mas ele se sente compensado quando a vê restituída e fora de perigo.Emma consegue restituir a felicidade ao reencontrar um conhecido da família, o jovem Leon, que ela reencontra numa apresentação de ópera que assistiu junto com o marido durante uma viagem do casal à capital.O medo de perder o novo amante e a chance de viver o tão esperado “Romance romântico” vai aos poucos construindo a ruína da Madame Bovary. Ela se afunda em dívidas e o consumismo, comum entre os burgueses do século XIX, a coloca num beco sem saída. Com o abandono de Leon, Emma não vê solução além do suicídio. As cenas que antecedem a sua morte por envenenamento com arsênico, têm fortes raízes naturalistas, com direito a agonia e detalhes médicos do sofrimento da protagonista.

...Emma começou a gemer, a princípio muito fracamente. Sacudiam-lhe os ombros grandes arrepios e tornou-se mais branca do que o lençol em que cravava as unhas. O pulso irregular era agora quase insensível (MADAME BOVARY p.233).
Depois da morte de Emma, Charles descobre estar falido e torna-se um pobre que luta contra a tristeza de perder o amor da sua vida. Mesmo quando descobre a traição da esposa, o amargurado Charles não toma as atitudes de um “Otelo” orgulhoso. Pelo contrário, ele procura encontrar em Rodolfo algo que possa ter encantado Emma, que não destrua a imagem da esposa aos seus olhos.

Um dia em que Carlos foi à feira de Argueil para vender o cavalo – último recurso -, encontrou Rodolfo. Mal se viram, empalideceram. Rodolfo, que apenas enviara o seu cartão, principiou por balbuciar desculpas, depois animou-se e levou o aprumo (fazia então muito calor, porque estavam em agosto) a ponto de convidá-lo a tomar um copo de cerveja.Sentado em frente dele, mordia o charuto, conversando, e Charles perdia-se em devaneios diante daquele rosto que amara. Parecia-lhe tornar a ver alguma coisa dela. Era uma espécie de encantamento. Quisera ser aquele homem. (MADAME BOVARY p.256).
Seu trágico e patético desfecho é a morte por desgosto num dia qualquer, no jardim de casa. A filha Berta, esquecida por todos, começa a afazer parte do proletariado e trabalhar em fábricas depois da morte de quase toda a família.Muitos se perguntam qual é o verdadeiro tema de “Madame Bovary”. Seria o adultério feminino, a crítica ao estilo romântico, crítica ao consumismo, à burguesia? Ao ler o romance pela primeira vez, o leitor tende a acreditar em qualquer um destes, ou em todos. Eles estão presentes sim. Mas a partir da segunda leitura, o leitor atencioso percebe que o grande tema proposto por Gustave Flaubert é a mediocridade humana. Mediocridade que permite que Charles seja dominado por todas as mulheres que se aproximam dele, que faz os amantes de Emma a usarem apenas para o seu próprio prazer, que faz Emma colocar a sua vida em jogo por uma ilusão lida em romances na juventude.Gustave Flaubert não se equivocou ao responder “Madame Bovary sou eu”, já que ele fazia parte da sociedade que procurou descrever na sua obra-prima e que inaugurou, se assim se pode afirmar, um movimento Realista, que se tornaria fecundo no mundo inteiro criticando e contrariando o Romantismo que Emma tanto amava e que a fez procurar nos homens menos “cavalheiros”, os heróis que deixariam tudo por amor e a fariam a mulher mais realizada do mundo.

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